Despojos e náufragos
Chove muito hoje. Em dias assim gosto de olhar o mar. Cinza, revolto, grande. Imensas ondas que, barulhentamente, jogam na areia despojos vindos sabe-se lá de onde. De que barcos perdidos em noites de tormenta, de que ilhas sacudidas pelos ventos. Não sei porque despojos e náufragos me sugerem recomeço. Recolher, com coragem, na manhã seguinte, diante do vasto mar, tudo o que ficou na areia. E recomeçar. Reunir força e vontade para voltar, silenciosamente, à praia em busca do que o mar devolveu. E de novo sonhar. Manter no olhar a ternura necessária para vasculhar entre cacos e farpas a procura de alguma lembrança, uma palavra qualquer que prove que não se afundou, de todo, afinal. Onde aquele que estava ao meu lado, que navegava junto comigo, agora inominável e sem rosto? Procurar, tatear no escuro - mesmo que em vão. E ainda assim esperar pela manhã que virá e certamente trará novos despojos.
Crédito da imagem: "Ship", de Kleemas
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